quarta-feira, 17 de agosto de 2011

" A última quimera"

A ÚLTIIMA QUIIMERA (1995)
DE ANA MIRANDA:: A FIIGURA DO POETA AUGUSTO
DOS ANJOS NO SEU PROCESSO DE IIDENTIIDADE
                                                                        Inajara Silva de Albuquerque
                                                                        (Graduanda – UNESP/Assis)
                                                                        Profa. Dra. Maria Lídia Lichtscheidl Maretti
                                                                        (Orientadora – UNESP/Assis)

As narrativas ficcionais sempre tiveram cunho histórico, desde a Antiguidade,
mas costuma-se localizar o nascimento do gênero romance histórico no início do
século XIX, durante o romantismo, como o romance Ivanhoé (1819), do escritor inglês
Walter Scott (1771-1832). Os romances de Scott tornaram-se modelos para outros
escritores, obedecendo à seguinte “fórmula”:

A ação do romance ocorre numa ação anterior ao presente do
escritor, tendo como pano de fundo um ambiente histórico
rigorosamente reconstruído, onde figuras históricas reais ajudam a
fixar a época [...] Sobre esse pano de fundo histórico situa-se a trama
fictícia, com personagens e fatos criados pelo autor. Tais fatos e
personagens não existiram na realidade, mas poderiam ter existido, já
que sua criação deve obedecer a mais estrita regra de
verossimilhança. (ESTEVES, 1998, p.129)

O gênero romance histórico chegou às Américas com bastante intensidade,
como uma espécie de epidemia, embora saibamos da complexidade que é discutir
história e literatura, visto que elas se relacionam quando se trata da evolução do
homem. Assim, podemos pensar no que a ficção e história podem refletir na vida atual
do homem contemporâneo, nos âmbitos sociais, culturais, políticos e econômicos,
sendo a busca de identidade a mais preocupante nos tempos atuais.
No Brasil o romance histórico, nos séculos XX e XXI, é representado por
alguns escritores, dentre os quais se destaca a grande autora contemporânea Ana
Miranda, que nasceu em Fortaleza, em 1951, cresceu em Brasília, mas reside na
cidade do Rio de Janeiro desde 1969. Alguns de seus romances históricos são: Boca
do inferno (1989), O retrato do rei (1991), Sem pecado (1993) e A última quimera
(1995), todos publicados pela Companhia das Letras.
114
A última quimera é um romance histórico que narra a vida e a morte do poeta
paraibano Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos (1884-1913), que encantou e
desencantou o público com suas palavras frias, estranhas, usando vocábulos
científicos. É chamado de “o poeta da morte” e tem como única obra um livro de
poemas de nome Eu (1912).1
O romance A última quimera, além de ser histórico, possibilita-nos pesquisar
o tema do duplo porque o narrador age como se fosse a personagem Augusto, já que
imita as suas ações num sentido amplo. Além disso, sabemos que a relação entre a
literatura e a psicanálise é importante para ambas as ciências cujo objetivo comum é
permeado pela interpretação:

Literatura e psicanálise se relacionam como um eu e seu outro,
encontram-se no projeto reiteradamente reinventado de retomar a
experiência e o desejo humanos em sua dimensão de significação, de
interpretação e de sentido. (SAMPAIO, 2002, p. 175).

A temática do duplo foi abordada de forma pioneira e muito completa por Otto
Rank (1914), em sua obra O duplo. Segundo Freud, “Ele penetrou nas ligações que o
duplo tem com reflexos em espelhos, com sombras, com os espíritos guardiões, com a
crença na alma e com o medo da morte”. (FREUD, 1976, p. 293).
Todas essas características são produzidas pelo duplo sendo que elas podem
ser positivas, isto é, resultantes de um processo de identificação entre o “eu” e seu
duplo, ou negativas – como forma de rejeição para com o duplo.
O narrador, em A última quimera, demonstra momentos de positividade em
relação ao poeta quando a dimensão está focada na vida poética e artística de
Augusto; porém, quando o assunto é Esther, mulher de Augusto, tudo muda e o lado
negativo assume a dianteira e o narrador não consegue deixar de criticar ou até
mesmo de sugerir que Augusto não foi bom enquanto marido.
O duplo estabelece sempre um compromisso entre o interior e o exterior do
sujeito em relação ao “eu” (positiva ou negativamente, como vimos) e por isso várias
são as discussões quando se trata do duplo. No artigo de Carla Cunha sobre o
assunto (2009), ela estabelece uma distinção de características a propósito do Duplo,
que pode ser endógeno, “estabelecendo a harmonia e cumplicidade entre o eu e o
1 Eu foi a obra que o poeta Augusto dos Anjos escreveu antes de morrer. Depois da sua morte o amigo
Órris Soares a reedita com os poemas que Augusto guardava; assim, desde então, várias são as edições,
como a obra intitulada Eu e outras poesias.115


outro” num aspecto interior e, por outro ângulo, o duplo exógeno, que surge não
necessariamente a partir do “eu”. Podemos notar que o narrador tem dentro de si os
dois aspectos já que a formação do duplo surgiu tanto interiormente quanto
exteriormente, mas observa-se que os dois conceitos se condensam formando um só.
Walter Benjamin caracteriza três estágios evolutivos por que passa a história
do narrador. Primeiro estágio: os narradores clássicos, cuja função é dar ao seu
ouvinte a oportunidade de um intercâmbio de experiência; Segundo: o narrador do
romance, cuja função passou a ser a de não mais poder falar de maneira exemplar ao
seu leitor; Terceiro: o narrador que é jornalista, ou seja, aquele que só transmite pelo
narrar a informação. A literatura pós-moderna existe para falar da pobreza da
experiência, mas também da pobreza da palavra escrita enquanto processo de
comunicação. A passividade prazerosa e o imobilismo crítico são posturas
fundamentais do homem contemporâneo, ainda e sempre mero espectador ou de
ações vividas ou de ações ensaiadas e representadas.
Não é por acaso que o tema do duplo é essencial para a literatura e, mais do
que isso, numa obra contemporânea onde uma das abordagens é a falta de identidade
ou a busca de uma. O duplo é interpretado pelo que é o “real” e o ficcional no discurso
do narrador em relação à personagem de ficção Augusto, ou seja: de quem são os
pensamentos e as ações? Do narrador ou do poeta? Existe também a dialética entre o
que é história e o que é ficção na própria obra em relação à personagem histórica.
Veja-se, por exemplo, o trecho em que se insinua uma relação de incesto entre o
poeta e sua irmã:

Francisca e Augusto dormiam juntos, numa rede, abraçados, às
escondidas dos pais. Apesar de saber disso, e dos longos passeios a
cavalo do casal de irmãos, e dos banhos que tomavam juntos, jamais
suspeitei de sentimentos incestuosos entre eles. Porém alguns anos
mais tarde encontrei casualmente na rua o doutor Cão, que me disse
ter sérias suspeitas de que Augusto engravidara sua irmã, quando
ainda moravam no engenho. Francisca teria feito um aborto.
(MIRANDA, 1995, p. 142).

Convém lembrar que, em seus primórdios, as diferenças entre a literatura e a
história não eram marcadas como passaram a ser:
Houve um período em que simplesmente o discurso da literatura se
confundia com o discurso da história. Parte da história da civilização
Grega, por exemplo, se conta através dos versos de Homero, que
canta a história grega. (ESTEVES, 1998, p.126).
A imagem da personagem Augusto dos Anjos é extremamente representada
pelo discurso duplo do narrador, sendo que a “colagem” dos poemas e das cartas que
116
a mãe escrevia para o poeta também aparece demonstrando a “autenticidade” da
narrativa, e as ações “reais” do poeta. A este propósito, considere-se o que afirma
Lacan:
Basta compreender o estádio do espelho como uma identificação, no
sentido pleno que a análise atribui a esse termo, ou seja, a
transformação produzida no sujeito quando ele assume uma imagem
– cuja predestinação para esse efeito de fase é suficientemente
indicada pelo uso, na teoria, do antigo termo imago. (LACAN, 1998, p.96).


Ao identificar o outro como imagem nós podemos compreender que há uma
relação entre o reflexo de um espelho e a teoria de duplicação do “eu” para se formar
o outro. Eis um exemplo: O filho do homem numa idade em que, por um curto espaço
de tempo, é superado em inteligência instrumental pelo chimpanzé que já reconhece
obstante como tal sua imagem no espelho. Portanto, os estudos de Lacan sobre a
formação do eu mostram como buscamos nossa identidade desde os primeiros
momentos de vida, e o outro sempre é o espelho em que procuramos nossa imagem,
um reflexo a ser imitado, porém o indivíduo escolhe a quem deseja se assemelhar
sendo isso um grande perigo para a formação do caráter.
O enredo do romance ocorre da seguinte forma: ele é dividido em cinco
partes, sendo a primeira intitulada “Rio de Janeiro 12 de novembro 1914”; em seguida
temos “A viagem”; “Leopoldina-MG”; “De volta para o Rio de Janeiro” e “Epílogo”.
Durante a viagem realizada percebemos no discurso do narrador como ele é obcecado
pelo poeta e por Esther, mulher de Augusto. Por isso o poema “Versos Íntimos”
aparece muitas vezes ao longo do romance, isto é, quando o foco do discurso estiver
direcionado a Esther: “Como estará ela? Tiro do bolso um fósforo e acendo meu
cigarro”. (MIRANDA, 1995, p.15).
Certamente Augusto dos Anjos foi o Espelho ou a imagem que o narrador
teve, já que fica evidente o fascínio pelo poeta. O discurso narrado é sempre
representado pelo Duplo. Eis um exemplo:
Reuni todos os meus manuscritos [...] derramei querosene sobre as
folhas manuscritas, sentindo que meu peito se separava. Ali estavam
minhas lembranças, minhas misérias, meus sofrimentos de amor,
meu ódio, minhas esperanças, meu erotismo, minhas paixões, meus
segredos, os sonetos escritos às mulheres que amei, que desejei,
cada um com um título de nome: Zolina, Marion Cirne, Camila. Ali
estavam os meus poemas às prostitutas do Senhor dos Passos que
eu admirava de longe, apaixonado, logo que cheguei da Paraíba: o
meu Eu. Ali estava toda a minha vida (MIRANDA, 1995, p. 42).117


Diante desse trecho observamos a forma dualista pela qual o narrador
demonstra semelhança com o próprio poeta, mas, se a priori a função do narrador é
narrar, por que ele aparece como se fosse Augusto narrando, assumindo seu perfil em
determinadas partes do romance? Esse é o típico narrador pós-moderno que vai ser
questionado, segundo o crítico Silviano Santiago, nos seguintes termos:
“Quem narra uma história é quem a experimenta, ou quem a vê? Ou
seja: é aquele que narra ações a partir da experiência que tem delas,
ou é aquele que narra ações a partir de um conhecimento que passou
a ter delas por tê-las observado em outro?”. No primeiro caso, o
narrador transmite uma vivência; no segundo caso, ele passa uma
informação sobre a outra pessoa. Pode-se narrar uma ação dentro,
ou fora dela. (SANTIAGO, 1989, p.35).


Concllusões

Justifica-se, assim, pesquisar a obra A última quimera (1995), de Ana
Miranda, pela importância de tematizar o duplo na literatura contemporânea brasileira,
tal como observamos anteriormente. Além disso, autora é conceituada pela crítica, tem
livros publicados em dezessete países, recebeu o prêmio Jabuti em 1990. A última
quimera recebeu o prêmio da Biblioteca Nacional Brasileira, e merecidamente, pois
conta a história de um dos poetas mais originais que a nossa literatura já teve. O
romance é também uma “colagem” dos poemas do poeta simbolista. A narrativa
suscita a identificação de trechos de Eu e outras poesias e a reflexão sobre a função
que eles desempenham na unidade da narrativa. É interessante pesquisar A última
quimera, pois há simultaneamente duas obras, uma dentro da outra, ou seja, o próprio
romance como ficção literária e a obra de Augusto dos Anjos Eu e outras poesias
como ficção da ficção do romance, onde relacionamos a história e a ficção como
questionamento.
A possibilidade de estudar o duplo no romance A última quimera é devida à
relação que existe entre a Literatura e a Psicanálise como procedimentos de
subjetivação e da interpretação. O uso da psicanálise na obra não é um diagnóstico
médico, pois os elementos imaginários são reconstruídos pela linguagem a partir de
um mundo real. Ou, em outros termos, “Hoje a psicanálise e a literatura se misturam:
há vários textos escritos por não analistas onde conceitos analíticos são utilizados
para fazer crítica literária. Da mesma forma, várias coletâneas, escritas por analistas,
abordam questões literárias” (CHNAIDEMAN, 1989, p.23).
O duplo tem como um dos pontos de vista a imortalidade. Podemos pensar
que a obra do poeta e ele mesmo “revivem” dentro do romance enquanto substância,
118
um retorno do “Eu” contemporâneo. Raymundo Magalhães Jr., na obra Poesia e Vida
de Augusto dos Anjos, comenta o seguinte: “Desde então se alargou de tal modo o
interesse pela obra de Augusto dos Anjos que são incontáveis os ensaios e até livros
inteiros consagrados ao estudo de sua obra” (MAGALHÃES JR., 1977, p. 317).
Trabalhar, enfim, diretamente com a obra Eu e outras poesias de Augusto dos
Anjos ou o romance de Ana Miranda, A última quimera, é um modo pelo qual a obra
do poeta não viva de fato, mas que pelo menos sobreviva pela imortalidade, através
de mais um trabalho escrito sobre o poeta.

Refferênciias biiblliiográffiicas
ANJOS, Augusto dos. Eu e outras poesias. São Paulo: Martin Claret, 2006.
CHNAIDERMAN, Miriam. Passeando entre a psicanálise e a literatura. In: Ensaios de
psicanálise e semiótica. São Paulo: Escuta, 1989.
ESTEVES, Antonio. (org.) Estudos de Literatura e Lingüística. São Paulo: Arte &
Ciência, 1998.
ESTEVES, Antonio & CARLOS, Ana Maria. Ficção e História: leituras de romances
contemporâneos. São Paulo: UNESP Publicações, 2007.
LACAN, Jacques. O estádio do espelho na formação do eu. In: ______. Escritos. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
MAGALHÃES Jr., Raimundo. Poesia e vida de Augusto dos Anjos. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1977.
MIRANDA, ANA. A última quimera. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
SANTIAGO, Silviano. O narrador pós-moderno. In: ______. Nas malhas das letras.
São Paulo: Companhia das Letras, 1989.



quinta-feira, 28 de julho de 2011

A Moreninha






A Moreninha 

             Joaquim Manoel de Macedo

A Moreninha é um dos principais romances brasileiros e seu autor, ao lado de Manuel Antonio de Almeida, José de Alencar, Machado de Assis, Aluísio Azevedo e outros (poucos) é um dos mais importantes autores da língua portuguesa. Este livro, centrado no romance entre Augusto e Carolina, é um dos pilares de nossa literatura. Numa época onde a cultura era totalmente voltada para a Europa, A Moreninha é uma das primeiras e magníficas tentativas de fazer literatura brasileira, observando usos e costumes do Brasil do Segundo Império, retratando o cotidiano da vida brasileira em meados do século passado. Joaquim Manuel de Macedo (1820-1881) era médico, mas jamais exerceu a profissão, tendo dedicado sua vida à literatura, à imprensa e ao teatro. A obra retrata as características do movimento literário a que pertence à medida que possui espírito romântico (final feliz), nostalgia medievalista (indianismo), idealismo, culto à natureza, cristianismo (Festa de San’t Ana), sentimentalismo, linguagem popular e liberdade criadora. Retrata também  uma realidade fantasiada presente no autor.

Tempo / Espaço / Ação

O tipo de ambiente predominante é físico. Foram encontradas algumas descrições interessantes, a que mais nos agradou foi: "A Ilha de... é tão pitoresca como pequena. A casa da avó de Filipe ocupa exatamente o centro dela. A avenida por onde iam os estudantes a divide em duas metades, das quais a que fica à esquerda de quem desembarca, está simetricamente coberta de belos arvoredos, estimáveis, ou pelo aspecto curioso que oferecem. A que fica à mão direita é mais notável ainda; fechada do lado do mar por uma longa fila de rochedos e no interior da ilha por negras grades de ferro, está adornada de mil flores, sempre brilhantes e viçosas, graças à eterna primavera desta nossa boa Terra de Santa Cruz."

A seqüência narrativa e a ação dos personagens se dão em tempo linear - trinta dias. Os eventos narrados desenrolam-se durante os trinta dias pelos quais a aposta era válida. A aposta foi feita em 20 de julho de 1844, uma segunda-feira, e termina no dia do pedido de casamento, 20 de agosto do mesmo ano.

Existe um recuo ao passado. Quando a história se inicia, Augusto está no quinto ano de Medicina e conquistara, entre os amigos, a fama de inconstante. Nos capítulos VII e VIII, o autor conta-nos a origem da instabilidade amorosa do herói. Tudo começara há oito anos, quando Augusto contava 13, e Carolina 7 anos de idade.

Foco narrativo

O narrador, na verdade, é Augusto, pois perdeu a aposta feita com Filipe; mas é narrado na 3ª pessoa, por um narrador onisciente. Aqui e ali, ele se intromete um pouco na história, bancando o moralista.

A importância para a obra e a repercussão no leitor é que a utilização deste tipo de narrador causa o aprofundamento psicológico das personagens, o que não ocorreria se o narrador não fosse onisciente ou em 1ª pessoa. A seqüência narrativa e a ação dos personagens se dão em tempo cronológico pois ocorrem em três semanas e meia.

Temática / Crítica social

O tema da obra é a fidelidade ao amor de infância.

Como crítica social vemos o casamento, pois, na época o ajuste matrimonial era feito pelos pais dos jovens. A união dos filhos ganhava, pois, conotações de negócio indissolúvel, tratado com a seriedade dos adultos pensantes, conseqüência clara do amor arrebatador dos jovens; vemos também referência à escravidão embora sem grande relevo. Mas há, em A Moreninha, referência ao trabalho escravo e aos castigos corporais a que os negros eram submetidos.

Personagens

As personagens mais importantes são Augusto e Carolina. A personagem que mais chama atenção é Augusto que era um estudante de medicina alegre, jovial e inconstante em seus amores. O autor lhe confere complexidade já que no início da história o personagem é descrito de uma forma e no final dela é descrito de outra.

A personagem central é D.Carolina, menina de quatorze anos,  possuía cabelos negros, olhos escuros, era travessa, inteligente, astuta e persistente na obtenção de seus intentos.

Enredo



Considerado o primeiro romance romântico brasileiro propriamente dito, A Moreninha (1884), obra-prima de Joaquim Manuel de Macedo, segue a tendência do romance-folhetim, alcançando grande repercussão por apresentar os quesitos necessários para satisfazer o gosto do leitor da época: o namoro difícil ou impossível, a comicidade, a dúvida entre o desejo e o dever, a revelação surpreendente de uma identidade, as brincadeiras de estudantes e uma linguagem mais inclinada para o tom coloquial.
O romance é narrado em terceira pessoa, com narrador onisciente. O tempo transcorre na ordem cronológica, apenas uma volta ao passado, nos capítulos sete e oito, quando Augusto conta à D. Ana, avó de seu amigo Filipe, o episódio de seu juramento amoroso. A história se passa e dois lugares: na cidade do Rio de Janeiro, representando a vida urbana e social, e na ilha onde mora D. Ana, simbolizando o paraíso de amor. O estilo do texto é marcado pelo ritmo ágil, com a presença freqüente de diálogos entre os personagens, o que nos dá a impressão de que a história está acontecendo no ato da leitura.
O enredo de “A Moreninha” inicia-se com a ida de um grupo de amigos estudantes– Augusto, Fabrício e Leopoldo – à convite de Filipe, à casa de sua avó – D. Ana – residente numa ilha próxima ao Rio de Janeiro, onde passarão o dia de Sant’Ana e o fim de semana. Filipe aposta que os amigos irão se interessar por suas primas – Joaninha, Quinquina e suas amigas, Gabriela e Clementina – ou por Carolina, sua irmã. Namorador inconstante, Augusto é desafiado por Filipe e seus amigos que lhe propõem uma aposta: caso ele se apaixone por uma das moças, escreverá a história de sua derrota; se não se apaixonar, Filipe é quem deverá escrever sobre a vitória triunfal de seu amigo inconstante.
Ao chegar à ilha, Augusto conhece Carolina, por quem fica encantado, enquanto Fabrício o provoca, afirmando ser ele incapaz de amar seriamente. À noite, todos da casa resolvem caminhar pela ilha. Após andar brevemente com Carolina, Augusto junta-se à D. Ana, que o leva a uma gruta próxima, onde havia uma lendária fonte. Ele confidencia-lhe que, há sete anos, quando adolescente conhecera uma jovem na praia: os dois haviam ajudado um pobre velho que, agradecido, profetizou o casamento dos dois no futuro. Num gesto simbólico, o idoso casara-os, fazendo com que trocassem presentes: ele deu-lha um camafeu e ela, uma esmeralda. Trocara juras de amor eterno e de um casamento verdadeiro no futuro. Carolina, porém, a tudo escutava escondida.
Em troca da confidência, a avó de Filipe conta-lhe a história de uma índia que se apaixonara por um índio guerreiro, mas não fora correspondida. De tanto chorar, suas lágrimas deram origem àquela fonte. Ao beber dela, o guerreiro se apaixona pela índia e os dois viveram juntos para sempre.
No dia da festa de Sant’Ana, Augusto, como namorador que é, declara-se para as quatro moças da casa. Na manhã seguinte, recebe um convite anônimo para um encontro na gruta. Lá ele encontra as quatro moças, bebe da fonte, e passa adivinhar os segredos delas, fazendo parecer que era o poder da fonte. No entanto, ele não faz nada além de contar as peripécias que havia bisbilhotado da conversa das moças. Neste contexto aparece Carolina, que repete o mesmo gesto, passando a contar as verdades íntimas de Augusto, que ela também havia escutado no passeio à noite, na véspera do dia de Sant’Ana. Mas vai embora antes mesmo de Augusto tivesse tempo de declarar que era ela a quem amava.
De volta à cidade, não consegue esquecê-la. Passam a se encontrar todos os domingos. Ele chega até a confessar seu amor, mas ela se contém. Como vinha faltando às aulas da faculdade, o pai proibiu-lhe de ir à ilha. No entanto, ele cai doente por vários dias. O pai resolve então atender a vontade de Augusto e ambos combinar de irem juntos, no domingo próximo, à casa de D. Ana.
O amor impossível e a mulher idealizada são freqüentes na prosa romântica. Para resolver o impasse amoroso, costuma haver duas saídas: o final feliz ou o trágico. Em “A Moreninha”, o impedimento é superado quando, por coincidência, os personagens se conhecem, percebendo serem elas as mesmas personagens de sete anos antes. O resultado é o final feliz.
Assim, o final do romance é considerado perfeitamente de acordo com o ideal amoroso romântico e as normas sociais, em virtude de não ter havido adultério ou traição em relação à “primeira esposa”. Resta apenas a Augusto pagar a aposta: que, considerando-se paga, temos o romance “A Moreninha”.
Fontes
CEREJA, William Roberto e MAGALHÃES, Thereza Cochar. Literatura Brasileira em diálogo com outras literaturas. 3 ed. São Paulo, Atual editora, 2005, p.251-2.

Leia a obra na íntegra acessando o link abaixo:

http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000008.pdf

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Personagens



A PERSONAGEM NA NARRATIVA
------------------------------------------------------------------------------------
Estudos Literários

O termo personagem vem do Latim, persona(m), cujo significado é, máscara de ator de teatro. Em português, pode ser o personagem ou a personagem. Este último, talvez por causa da origem do termo em latim [persona]. No masculino, há quem diga ser devido à ausência de mulheres no teatro antigo; todos os personagens eram masculinos.
As personagens são arquitetadas pela fantasia do prosador e atuam no interior da narrativa literária; têm por função simular pessoas, comportamentos e sentimentos reais. Por isso, são construídas à imagem e semelhança dos seres humanos. Se bem construídas, nelas, teremos a impressão de pessoas vivendo situações e dilemas semelhantes aos nossos.
A personagem só existe na história se dela participa, ou seja, se age ou fala. Se uma determinada personagem é apenas mencionada na história por outras personagens, mas não participa direta ou indiretamente das ações, não será considerada uma personagem.
1. FUNÇÕES DAS PERSONAGENS
Quanto à função que desempenham na narrativa, as personagens podem ser:
a) Protagonista (do Grego, protagonistés) - É a personagem principal em torno do qual se constrói toda a trama. O protagonista pode ser caracterizado como herói ou anti-herói. Em nossa literatura é muito frequente o anti-herói como protagonista. Macunaíma é um exemplo do herói sem nenhum caráter, ou seja, o anti-herói.
b) Antagonista (do Grego, antagonistés) - é a personagem que cria o clima de tensão, opondo-se ao protagonista. Ao construir uma narrativa, nunca despreze o antagonista; o sucesso de uma narrativa está diretamente ligado à perfeita caracterização desse personagem. Que digam as novelas de televisão!
• Protagonista e antagonista são caracterizados, na linguagem popular como "mocinho e bandido". Em outros termos, herói e vilão.
c) Personagens Secundárias e Figurantes - personagens sem grande importância na narrativa. As secundárias participam na ação, no entanto, não desempenham papéis decisivos. Os figurantes não têm qualquer participação no desenrolar da ação, cabendo-lhe apenas ajudar a compor um ambiente ou espaço social.
2. CARACTERIZAÇÃO DAS PERSONAGENS
a) Indivíduos - são personagens que possuem características pessoais marcantes, que acentuam a sua individualidade. Em Dom Casmurro (Machado de Assis), Capitu é uma personagem indivíduo. Observe:
“Na verdade, Capitu ia crescendo às carreias, as formas arredondavam-se e avigoravam-se com grande intensidade; moralmente a mesma coisa. Era mulher por dentro e por fora, mulher à esquerda e à direita, mulher por todos os lados, e desde os pés a cabeça. (...); os olhos pareciam ter outra reflexão, e a boca outro império.”
b) Caricaturais - são personagens cujos traços de personalidade ou padrões de comportamento são propositalmente acentuados (às vezes beirando o ridículo) em função do cômico ou da sátira. São personagens muito comuns, principalmente, em novelas de televisão. Manuel Antônio de Almeida, em Memórias de um Sargento da Milícia, nos descreve uma personagem caricatural:
“Era a comadre uma mulher gorda, bonachona, ingênua ou tola até certo ponto, [...] todos a conheciam por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade. Era a folinha mais exata de todas as festas religiosas que aqui se faziam; sabia de cor os dias em que se dizia a missa em tal ou tal igreja, como a hora e até o nome do vigário; era pontual à ladainha, ao terço, à novena; não lhe escapava via-sacra, procissão, nem sermão."
c) Típica ou Tipos – são personagens identificados pela profissão, pelo comportamento, pela classe social, enfim, por um traço distintivo comum a todos os indivíduos duma categoria. Personagem Tipo seria o jornalista, o estudante, a dona-de-casa, a solteirona etc. É o caso, por exemplo, da maioria das personagens de Memórias de um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida, como o Barbeiro, a Parteira, o Major, os Ciganos, etc. O mesmo vale para a maioria dos personagens de Gil Vicente.
3. EVOLUÇÃO DAS PERSONAGENS
Quanto à evolução, dentro da narrativa, as personagens podem ser:
a) Planas ou Estacionárias – são personagens construídas em redor de uma única qualidade ou defeito. Por isso, não tem profundidade psicológica, e não alteram seu comportamento no decorrer da narrativa. São personagens estáticas, definidas em poucas palavras, por um traço, por um elemento característico básico, que as acompanha durante toda a história. É o irônico que está sempre fazendo ironias, o chato que só sabe ser chato, ou seja, são personagens que não apresentam contradições: são sempre boas ou más; corajosas ou mentirosas; malandras ou trabalhadoras. Como exemplo, podemos citar Iracema, do romance Iracema, de José de Alencar.
• As personagens planas, normalmente, são caracterizadas como tipo ou caricatural.
b) Redondas, Esféricas ou Evolutivas – são personagens complexas; definidas por vários traços diferentes, cheias de contradições; apresentam comportamentos imprevisíveis, enigmáticos, que vão sendo definidos no decorrer da narrativa, evoluindo e, muitas vezes, surpreendendo o leitor. Ora são covardes, ora corajosas; ora possuem virtudes, ora defeitos; enfim, expressam a verdadeira natureza humana. A personagem-protagonista de João do Santo Cristo do texto Faroeste Caboclo, é evolutiva, pois é uma mistura de santo e bandido. ®Sérgio.
_____________________________________________________
Algumas informações foram extraídas e adaptadas ao texto de: Massaud Moisés, A Criação Literária. E de: José de Nicola, Ernani Terra e Floriana Toscano, Literatura e Produção de Textos.

Análise do livro: O Guarani

Análise do livro “O Guarani

Desenvolvimento

História de José de Alencar

[José Martiniano de Alencar] Escritor brasileiro (Mecejana CE, 1829/1877). Pelo volume e importância da mensagem implícita em sua obra, pode ser considerado o patriarca da literatura brasileira.
Passou a primeira infância em sua terra natal, em contato com a natureza. Aos nove anos, viajou para a Bahia, em longa travessia pelo sertão. “A essa jornada cheia de acidentes e feita aos nove anos, deve ao autor as mais vigorosas impressões da natureza americana, e das quais se acham os traços em muitos de seus livros, especialmente no Guarani e Iracema.
No Rio de Janeiro, entre 1840 e 1843, freqüenta o colégio. Infatigável leitor, a sós ou em voz alta nos serões familiares, foi devorando novelas de amor, aventura ou históricas. Mudou para São Paulo e então começou a escrever. Em 1847 escreve o romance Os Contrabandistas. Sua obra de ficcionista iniciou-se dez anos depois com a publicação de O Guarani que lhe granjeara enorme popularidade ao ser lançado em folhetins lidos avidamente até mesmo nas ruas, à luz dos lampiões.
Para encerrar podemos dizer que Alencar contribuiu muito para a nossa língua ao romper a acanhada forma de sintaxe lusitana e escrever usando uma linguagem livre e de grande força poética.

A importância da obra

Publicado em 1857, O Guarani é a expressão máxima do Romantismo na ficção de José de Alencar e de nossa literatura. Nesse romance, o escritor consegue adaptar com perfeição os valores do movimento romântico europeu à realidade brasileira, de acordo como a percebiam nossos intelectuais no século XIX.
Peri personifica exatamente o ideal de herói que se encontra nas obras dos autores estrangeiros desta escola literária. Mais que isto, Peri é um índio, um homem primitivo, cujo caráter está alheio às influências “perniciosas” da civilização.
Neste sentido, ele é a representação concreta do “bom selvagem” de Rousseau, ao mesmo tempo que simboliza a índole do homem brasileiro, num momento em que o país recém-independente precisa afirmar-se como nação.
Da mesma forma, o cenário das matas virgens do passado colonial constitui a expressão nacional equivalente ao mundo medieval que os românticos da Europa elegeram como o espaço e o tempo privilegiados, em sua literatura altamente idealizada, que apresentava ao leitor uma visão de mundo sublime.
O desenvolvimento do enredo apresenta amor e aventura: os fatos se sucedem numa seqüência ininterrupta, característica de imaginação prodigiosa de Alencar. Neles, o autor encontra os elementos adequados para fazer de sua narrativa uma verdadeira epopéia: é a história de um povo que ele conta. Através da união do índio Peri com Ceci - a moça branca e européia, filha do colonizador - podemos imbuir que ele narra a formação da nacionalidade brasileira.

História


A história do Livro “O Guarani”  passa-se no estado da Paraíba, as margens do Rio Paquequer, próximo a esse rio morava a nobre família de D. Antônio de Mariz, um fidalgo Português que era leal ao seu país. Casado com D. Lauriana tinha dois filhos: Dom Diogo de Mariz e Cecília. Morava também nesta casa Isabel, filha de D. Antônio com uma índia, D. Álvaro, um nobre cavalheiro, Aires Gomes, e os ajudantes de D. Antônio.
Isabel, andava muito com Cecília, as duas sempre estavam juntas, e em um certo dia ela contou-lhe sobre seu amor por Álvaro, a partir daí Cecília deixou o caminho livre a para sua “Irmã” e apesar de Álvaro sentir uma atração por Isabel ele acaba fazendo um juramento a D. Antônio que ele se casaria com Cecília.
Peri um Índio, que salvara a vida da filha do casal passou a freqüentar a casa e atender todos os pedidos de Ceci, ele deixou sua tribo e sua família. Entre estas pessoas que conviviam com a família existia um estrangeiro cujo nome era Loredano, que na verdade viera atrás de um tesouro, e que sonhava em casar-se com Cecília.
Em uma caçada, D. Diogo mata uma índia da tribo dos Aimorés e então  toda a família fica ameaçada pelo que aconteceu. A tribo jura vingança contra todos os moradores da casa através do assassinato de Cecília. Com isso a casa é assediada por diversos perigos. Dom Antônio prevendo o pior manda seu filho ao Rio de Janeiro para procurar ajuda.
Loredano se amotina com os capangas e planeja matar toda a família, exceto Cecília. Seu plano não foi possível porque os Aimorés chegam para a vingança. Com isso a família fica isolada na sala principal da casa e os capangas em outro cômodo da residência. Nesse alvoroço Álvaro declara seu amor perante Isabel, mas fica com receio de quebrar sua palavra.
Devido a ameaça, Peri teve uma idéia e resolve acabar ele mesmo com os Aimorés e os Capangas e salvar a sua senhora. Para isso era necessário a sua morte. Não pensou duas vezes, colocou veneno nos suprimentos dos causadores do motim, passou no corpo e também tomou desse veneno. Feito isso entregou-se ao Aimorés. Ele sabia que eles eram Antropófagos, e que ao ser morto todos os índios também morreriam.
O seu plano não foi concretizado, porque D. Álvaro, a mando de D. Antônio e de Ceci foi salvá-lo. Peri para não morrer do veneno que ingeriu foi buscar na mata um antídoto natural. Na volta encontrou D. Álvaro ferido, mas este não conseguiu sobreviver. Ao chegar na casa, Pei o levou até o quarto de Isabel, esta devido o seu grande amor acaba suicidando-se.
O clima esquenta, os Aimorés começam a lançar flechas de fogo em direção a casa. Dom Antônio vendo que não havia mais esperanças de salvação, pede a Peri para se tornar cristão e salvar Ceci.
Feito isso, Peri sai rumo as margens do Paquequer com Cecília em seus braços. Já no rio, ouve uma explosão vinda da casa e uma bola de fogo saindo da colina.
Já ao amanhecer, Cecília acorda e Peri lhe conta tudo o que havia se passado. No início ela se revolta, queria morrer junto a seu pai e sua mãe. Após uma pequena reflexão, vê que estava ao lado da pessoa que lhe salvara a vida pela terceira vez. Lembrou-se de todos os pedidos que fez a Peri e que este os cumpriu com muito amor, também lembrou que Peri fazia de tudo para arrancar um simples sorriso de seu rosto. Salvou-lhe de uma pedra, de uma flecha dos Aimorés e da explosão da casa.
No entanto queria ficar com Peri, só que ele tinha prometido ao já falecido D. Antônio que a levaria para o Rio de Janeiro junto a seu irmão D. Diogo.
Então começaram uma caminhada pela floresta e de repente ocorre uma enchente. Eles sobem rápido para o topo de uma palmeira, mas a água continua a subir e a palmeira acaba sumindo no horizonte.

Figuras de Linguagem


No texto encontramos algumas figuras de linguagem, que ao serem utilizadas dão qualidade e embelezamento ao texto. José de Alencar, usa diversas delas, principalmente nas falas de Peri.


Achamos a figura antítese nas seguintes frases:

“Peri, guerreiro livre, tu és meu escravo.” P. 96
“... me lembrará que fui para ti; e me ensinará a ser boa” P. 96


Encontramos também comparação:

“Suas ondas são calmas e serenas com as de um lago” P. 15
“... precipita-se de um só arremesso, como o tigre sobre a presa.” P. 15
“tu é belo como o sol” P. 96

Metonímia:

“Aos pés daquela a quem ama” P. 159

Paralelismo:

“Tu és grande, tu és forte” P. 95
“Peri ouviu e não respondeu, nem a voz a sua mãe, nem o canto dos guerreiros, nem o amor das mulheres.”  P. 96

Metáfora

“Tinha a cor do céu nos olhos; a cor do sol nos cabelos, estava vestida de nuvens, com um cinto de estrelas e uma pluma de luz.”   P. 96

Personificação

“O cajueiro quando perde sua folha, parece morto. Não tem tem flor nem sombra, chora umas lágrimas doces como o mel de seus frutos.” P. 96

Pleonasmo

“Viu passar o gavião
Se Peri fosse o gavião, ia ver a senhora no céu.” P. 96

Ironia

“É que eu serei a irmã mais velha.
Apesar de seres mais moça?...” P. 36

Personagens


A história apresenta os seguintes personagens e suas respectivas características.

Dom Antônio de Mariz  - Fidalgo português que lutou contra os franceses e fundou o Rio de Janeiro. Com domínio espanhol, retirou-se para o sertão, às margens do Paquequer. 

Dona Lauriana - Mulher de D. Antônio de Mariz, tinha bom coração, era um pouco egoísta mas dedicada.

Aires Gomes - Escudeiro e amigo  fiel de D. Antônio de Mariz que o acompanhava em todas as suas expedições, luta contra os amotinados e os índios

Dom Diogo de Mariz - Filho de D. Antônio, e responsável pela morte da índia que vem a provocar o ataque dos Aimorés aos portugueses.

Cecília - Filha de D. Antônio, que era uma deusa desse pequeno mundo que ela iluminava com o seu sorriso. Tinha Peri como seu “escravo” e era amada por Loredano e Álvaro.

Isabel - “Sobrinha” de D. Antônio (que todos sabem ser sua filha natural com uma índia). É apaixonada por Álvaro. - Personagem Redonda

Peri - Índio da Tribo dos Goitacás, filho de Arerê. Salvou Ceci e posteriormente sua família. Era tão fiel a sua amada que daria a própria vida para arrancar um simples sorriso de seu rosto. Peri, apesar de ser índio, tinha um bom vocabulário e imaginação.

D. Álvaro - Nobre cavalheiro que servia à família de D. Antônio. Era apaixonado por Cecília, sua fidelidade era tão grande que prometera a D. Antônio casar-se com sua filha.

Loredano - Ex-frade que quer explorar o tesouro de Robério Dias e casar-se com Cecília. Amotina-se contra D. Antônio. - Vilão da história e personagem redonda.

Cenário


A história se desenvolve no cenário das matas virgens brasileiras da época - ela se passa no estado da Paraíba - .A casa de D. Antônio se encontrava no alto de uma colina e às margens do rio Paquequer. O autor no primeiro capítulo descreve detalhadamente todas as características da paisagem. Isso demostra que José de Alencar se preocupava em mostrar toda a riqueza e beleza do Brasil através da adjetividade na descrição, isto é, ele usava para cada substantivo vários adjetivos.


1. Tempo: cronológico, em 1604, durante o período em que Portugal perde a independência política e forma a União Ibérica com a Espanha.

2. Espaço: estado da Paraíba, às margens do Rio Paquequer, afluente do rio Paraíba.

3. Narrador: onisciente, em 3ª pessoa.

4. Enredo: No início do século XVII, um dos fundadores do Rio de Janeiro, o fidalgo português D. Antônio de Mariz, em protesto contra a dominação espanhola (1580-1640), estabelece-se em plena floresta, construindo um verdadeiro castelo medieval, onde mora com sua família. Junto à sua casa, vive um bando de mais ou menos quarenta aventureiros. Estes homens entram no sertão, fazendo o contrabando de ouro e pedras preciosas e deixam-lhe um percentual.
Deles destacam-se dois: Álvaro de Sá, que ama respeitosamente Cecília ( e é amado por Isabel), e Loredano.
Um dia, Cecília é salva pelo índio Peri, um jovem cacique. Peri passa a viver então junto a eles, numa pequena cabana, pois tivera uma visão de Nossa Senhora, a qual lhe ordenara que a servisse e Ceci tinha as mesmas feições da Virgem Maria. Ceci sente medo do índio, mas depois de vários feitos que demonstram a devoção do índio percebe seu espírito nobre ("É um cavalheiro europeu no corpo de um selvagem").
Certo dia, por acidente, D. Diogo mata a filha do cacique dos aimorés. Os aimorés ("povo sem pátria e sem religião") querem vingança, exigindo em troca a vida de Ceci.
Peri, fiel aos portugueses, parte para o acampamento dos inimigos. Lá é preso e levado para o ritual antropofágico, mas ingere então poderosa dose de curare, um veneno terrível, pois, assim, quando os selvagens o devorassem, morreriam todos. É resgatado por Álvaro de Sá e diante da exigência de Ceci que ele tente se salvar, vaga pela floresta até encontrar o antídoto.
Loredano se amotina com os capangas e planeja matar toda a família, mas é desmascarado por Peri. Sem alternativa de resistência, D. Antônio chama o índio e diz que, se este se tornasse cristão, lhe confiaria a filha para que tentasse levá-la à civilização. O herói aceita e foge então com Ceci para o rio Paquequer onde escondera uma canoa. Ouve-se uma grande explosão.

 

Elemento de destaque na obra: o papel de índio 
A leitura de O guarani seria superficial sem uma reflexão sobre a ideologia sobre a identidade indígena apresentada na obra. Há três elementos indígenas no texto de Alencar, que vão se chocar ideologicamente, representando aquilo que a sociedade do século XIX vai aceitar e condenar, ou seja, refletindo o que se entendia que seria o bom índio, que deve ser aceito, e o índio mau, que deve ser rejeitado. Veja só:

*Peri: protege Cecília, torna-se cristão, volta-se contra os povos indígenas, abandona a floresta (mas não se atreve a ir à cidade).
*Isabel: permanece sempre ao lado dos brancos, civilizada.
*Aimorés: antropófagos, vingativos, terríveis, devem ser mortos.

Assim, o índio aculturado, que vive com os brancos (como Isabel) ou que é a eles subserviente (como Peri é, de forma até religiosa, a Cecília), são os bons índios, por cuja felicidade e sucesso o leitor é levado a torcer. Já o índio "in natura", não aculturado, é o vilão perigoso, que deve ser morto porque é ameaçador. O índio que não sente necessidade de ser como branco ou estar junto a ele é rejeitado na obra e não há mal nenhum em sua morte, afinal ele não passa de um selvagem.

Esta ideologia é fruto histórico do apagamento das marcas de identidade do nosso indígena na literatura brasileira. O índio que começa o Quinhentismo, em sua cultura, alvo de admiração e preconceito, ao mesmo tempo, no Arcadismo se transforma no índio que precisa do homem branco para ser salvo (dos jesuítas, em O Uraguai, ou do pecado e do paganismo, em Caramuru) e, finalmente, no Romantismo, é o índio que se despe de sua cultura por ter um caráter naturalmente bom, e, por isso, é um ser civilizado, com quem se pode conviver harmoniosamente. Aquele que não se encaixar neste perfil é mau, é rejeitado pelo leitor, e terá seu fim trágico assegurado na obra.
 
 Verossimilhança
Poucos escritores brasileiros, mesmo aqueles mais bem dotados tecnicamente, servem melhor ao estudo do que seja a própria arte da ficção, sobretudo no que diz respeito ao problema tão antigo quanto o próprio Aristóteles, o da verossimilhança. Em Alencar, a cada passo, em seus livros mais ambiciosos, pode ir o leitor de hoje rastreando elementos que conduzem ao cerne daquilo a que um crítico (Martin Price) chamou de "contrato ficcional”,  isto é, uma espécie de acordo tácito entre o autor e o leitor no que se refere às experiências do imaginário concretizadas pela narrativa. Tropeçando nos erros de sua ignorância etnográfica, esbarrando por entre as armadilhas da selvagia de uma terminologia "brasileira" ainda não bastante esclarecida em sua época  (e tudo isso os seus críticos menos argutos e mais caturros, de ontem e de hoje, fizeram e fazem valer como condenação geral de sua obra), Alencar foi afirmando a supremacia de uma realidade ficcional sobre a chateza das minudências de ordem histórica ou geográfica com o mesmo ardor e imprudência da maioria de seus personagens heróicos. Veja-se bem, no entanto: José de Alencar jamais perde a visão de conjunto de sua narrativa. Se a ação de seus personagens faz surgir acontecimentos que parecem bordejar o inverossímil, isto se dá por um momento fugaz, e o leitor termina pacificado. Tudo acaba por explicar-se convenientemente, desde que a imaginação funciona como elemento controlador e organizador

Conclusão:


O livro “O Guarani” é uma história ficcionista, mas o autor consegue contá-la de  uma forma que prende tanto a atenção do leitor que esta acaba transfigurando o irreal e se transformando em uma história verídica na cabeça do leitor. Isso mostra a capacidade e o poder da literatura em nossa vidas, através dela podemos viajar sem sair do sofá ou da cadeira em nos encostamos ao pegar um livro como este.
O Guarani portanto constitui uma espécie de símbolo da Pátria, podendo ser comparado ao hino nacional, à bandeira, ao brasão de armas. Sua leitura, portanto, é obrigatória para conhecer historicamente o pensamento brasileiro e refletir sobre o Brasil e sobre nossa origem.